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Os dois quadrinhos iniciam a história “As Aventuras de Nhô Quim, ou Impressões de uma Viagem à Corte“, do ítalo-brasileiro Angelo Agostini (1843-1910). A narrativa foi publicada em página dupla no jornal “Vida Fluminense” em 30 de janeiro de 1869. É por isso que a data foi escolhida para marcar o Dia do Quadrinho Nacional. A bem da verdade, é possível ver produções quadrinísticas anteriores, caso das charges. Mas isso não diminui o trabalho inovador do artista e a relevância histórica da obra, inclusive em termos mundiais.

Na falta de um nome preciso para o que criava, Agostini usou o rótulo “história em muitos capítulos”, estampado no canto direito superior da página. Percebiam-se aí os primeiros esboços da linguagem que se configuraria, algumas décadas depois, no que conhecemos por histórias em quadrinhos. Não havia balões, linhas cinéticas (traços que indicam movimento), onomatopeias, metáforas visuais. Mas havia a base dos quadrinhos, a narrativa mostrada em sequência.  E inovações no uso da linguagem visual, como esta:

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O primeiro quadrinho é todo preto. Motivo: o personagem estava num trem que, naquele momento, passava por um “túnel grande”. O recurso continua inovador, 140 anos depois. A história tinha toques de humor, como se lê no trecho acima, mas também de aventura. Essa temática só seria usada pelos americanos na virada das décadas de 1920 para 30.

O tom de aventura ficou mais evidente em outro trabalho de Agostini, bem mais popular que este no século 19: “As Aventuras do Zé Caipora“. A primeira parte da história é de 27 de janeiro de 1883. Uma vez mais, Agostini produzia uma narrativa em sequência, com legendas abaixo dos quadrinhos. Mas aprimorava o traço e o contorno dos quadrinhos, ora maiores, ora menores.

Costuma-se atribuir a “Yellow Kid“, produção norte-americana do fim do século 19, o ponto de partida para os quadrinhos. A história, na verdade, foi a primeira a usar os quadrinhos como meio de comunicação de massa de forma mais organizada. O início mesmo coube a outros trabalhos pioneiros, nem sempre lembrados.

A Inglaterra produzia “Dr. Sintaxe” já em 1798. Houve outros casos de histórias de humor na Europa ao longo do século 19. E os brasileiros têm em Angelo Agostini um dos precursores, inclusive na temática. O desenhista já produzia quadrinhos de aventura muito antes dos norte-americanos, que gostam de destacar serem os primeiros a produzir o gênero. 

Nota: as primeiras história de Nhô Quim e de Zé Caipora – não são a mesma narrativa, não custa reforçar – foram compiladas num livro, publicado em 2002 pelo Senado Federal. É de lá boa parte das informações mencionadas nesta matéria. Também são da obra as duas imagens que ilustram esta postagem.
>> BLOG DOS QUADRINHOS – por Paulo Ramos

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Página de "As Aventura de Zé Caipora" (1883), com diagramação bastante ousada para a época.